29.5.11

Evocar CBA (II)

No dia 16 de Abril de 1878 nascia na Guarda a mulher que iria ser a primeira eleitora em Portugal e em toda a Europa do Sul: Carolina Beatriz Ângelo, filha de Viriato António Ângelo e de Emília Barreto Ângelo. Depois de frequentar o Liceu na sua terra natal, rumou à capital onde estudou durante dois anos na Escola Politécnica e cinco na Escola Médico-Cirúrgica, concluindo o curso em 1902, ano do seu casamento com o seu primo, médico e republicano, Januário Barreto.
Pioneira a vários níveis, Carolina Beatriz Ângelo defendia o serviço militar obrigatório para as mulheres (ainda que limitado a funções administrativas) e, não obstante a oposição da família, foi a primeira mulher na prática cirúrgica, sendo a primeira médica portuguesa a operar no Hospital de S.José. Só mais tarde ela viria a dedicar-se à especialidade da Ginecologia.
Em 1906 CBA aderiu ao Comité Português da Associação Feminina Francesa La Paix et le Désarmement par les Femmes – criada em França por Sylvie Flammarion em 1899. Esta agremiação «pretendia uma resolução dos conflitos internacionais através de uma arbitragem exclusivamente feminina», como salienta Isabel de Jesus em As mulheres e a República, Agenda feminista 2010.
Apesar de todo o seu activismo, nunca quis abandonar a carreira médica e após o início da sua militância associativa vemos CBA aderir à Maçonaria em 1907, formando com Adelaide Cabete, Ana de Castro Osório e Maria Veleda um ‘quarteto’ de líderes que preparou o caminho do feminismo português nos alvores da República. Ainda em 1907 e em 1908 encontramos este quarteto no Grupo Português de Estudos Feministas, que transita em seguida para a Liga Republicana das Mulheres Portuguesas, lançada no final do mês de Agosto de 1908, e que muito batalhou pela implantação da República.
Como refere Regina Tavares da Silva em Carolina Beatriz Ângelo, esta mulher destacou-se como «activista republicana e militante feminista numa época em que ambas estas linhas de acção tinham um marcado ponto de encontro que, progressivamente, se foi afastando, quando as feministas verificaram que as suas pretensões eram rapidamente esquecidas por muitos daqueles que com elas tinham declarado simpatizar. Pretensões relativas a uma melhoria de estatuto legal e social das mulheres e, designadamente, ao direito ao voto.»
A história do voto é assim contada por João Esteves: «Com a publicação da primeira lei eleitoral da República, Beatriz Ângelo entreviu a hipótese de a mulher poder votar, já que aquela não excluía explicitamente, embora também não contemplasse, o sufrágio feminino. Decide-se então a explorar, até esgotar todas as possibilidades essa omissão na lei, desafiando de certa forma, os companheiros de sempre, ao considerar-se com direito a voto, por saber ler e escrever e ser chefe de família, pois era viúva – o marido morrera em 1910 – e tinha uma filha menor a cargo. Os episódios sucedem-se e, em menos de um mês, obtém por via judicial o direito a recensear-se e a tornar-se eleitora.»
Recenseada com o nº2513, CBA votou nas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, ocorrida a 28 de Maio de 1911. O facto teve lugar na Assembleia Eleitoral de Arroios - instalada no Clube Estefânia (não na rua Alexandre Braga, onde hoje se situa, mas sim nas suas antigas instalações da Rua de D.Estefânia) – e teve larga repercussão tanto na imprensa nacional, como estrangeira. No trabalho publicado em 1991, João Esteves afirmava que «mesmo tratando-se de um acto isolado, e também por isso mesmo, representou um passo importante na reafirmação sufragista das feministas portuguesas». Num artigo do mesmo investigador para a revista Faces de Eva nº11, «A primeira eleitora portuguesa Carolina Beatriz Ângelo», diz-nos: «Nunca uma dirigente feminista tinha sido objecto de tantas entrevistas, crónicas, debates e polémicas, sendo os títulos elucidativos da importância do que estava em causa (...); “O triunfo do feminismo – O voto da mulher em Portugal – Um jornal holandês [De Amsterdammer Weekblad woor Nederland] publica uma interessante entrevista com a sra.D.Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher que votou em Portugal” (A Vanguarda, 18/7/1911).»

Em Julho de 1911, CBA confessava à sua amiga Ana de Castro Osório: «tenho trabalhado muito, dias inteiros a discutir, a pensar, de maneira que tenho o cérebro em ebulição constante a que depois se seguem períodos de cansaço e fadiga como nunca tive. Se assim continuar só me restará a consolação de ter vivido muito em pouco tempo.»
[1]
E foi isso mesmo que aconteceu. Aos 33 anos de idade, no dia 3 de Outubro de 1911 falecia Carolina Beatriz Ângelo, de síncope cardíaca. Teve, como era seu desejo, «enterro civil e em tudo democrata» e foi sepultada no Cemitério dos Prazeres. Deixou orfã uma filha de oito anos, Maria Emília Ângelo Barreto, tendo expressamente exigido aos membros da família que se abstivessem de a vestir de luto.
A morte da primeira eleitora portuguesa foi noticiada por vários jornais nacionais, e pelo semanário Votes for Women, orgão das sufragistas inglesas.
Os Estudos sobre as Mulheres, a História das Mulheres, os Estudos Feministas e de Género continuam a dedicar muita da sua atenção ao legado de cidadania, deixado por esta e por muitas outras mulheres. Para que não sejam esquecidas, muitas/os investigadoras/es dedicam-lhes os seus propósitos científicos, produzindo o conhecimento necessário à transmissão da memória colectiva dos feminismos em Portugal. Eis-nos assim chegadas/os ao Seminário «Percursos Históricos e de Cidadania»!

[1] (BN, ACPC, Colecção de Castro Osório, Esp.N12/419, Carta a Ana de Castro Osório, de 2/7/1911. (Esteves: 2004)


Cristina L. Duarte


Bibliografia
Maria Regina Tavares da Silva, Carolina Beatriz Ângelo, «fio de ariana», CIDM, Lisboa, 2005.
João Esteves, A Liga Republicana das Mulheres Portuguesas – Uma organização política e feminista - 1909-1919, CIDM, Lisboa, 1991
João Esteves, Faces de Eva nº11, Ed.Colibri/UNL, Lisboa, 2004
João Esteves, Mulheres e Republicanismo (1908-1928), «fio de ariana», CIG, Lisboa, 2008
As mulheres e a República, Agenda feminista 2010, ed.UMAR/Faces de Eva, Lisboa, 2009
http://www.fcsh.unl.pt/facesdeeva/eva_arquivo/revista_11/eva_arquivo_numero11_j.html

25.5.11

O século das mulheres

Ainda é necessário referir numa conferência as mulheres portuguesas do principio do século XX?

Não eram elas a maioria da população?

Quem eram?

O que faziam?

O que pensavam?


















Abrangendo o período entre 1900 e 1926, Ana Vicente procurará responder a estas perguntas e colocar algumas questões.

26 de Maio, 17h00 - Fundação Calouste Gulbenkian - Auditório 3

hoje é dia de lançamento



17.5.11

Catalunha em Lisboa

Dia Internacional contra a Homofobia e a Transfobia

A Marcha Mundial das Mulheres associa-se às iniciativas que assinalam o dia 17 de Maio - Dia Internacional contra a Homofobia e a Transfobia. Rumo a um mundo, a um país, em que a justiça, a liberdade, a igualdade, a paz e a solidariedade imperem, a Coordenadora Portuguesa da Marcha Mundial das Mulheres (MMM), enquanto rede feminista internacional comprometida com a construção de um mundo livre de qualquer forma de opressão, onde cada pessoa possa gozar plenamente dos seus direitos e deveres de cidadania, não podia deixar de assinalar este dia.

A dignidade da pessoa humana e o direito à igualdade e à não discriminação, reconhecidos, nomeadamente, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação e noutros documentos jurídicos internacionais e europeus subscritos pelo Estado Português, têm expressão jurídica na Constituição da República Portuguesa e em vários diplomas do nosso quadro legal. Contudo, a experiência mostra que as leis não são totalmente cumpridas pelo Estado, pelas entidades patronais, pelas instituições e pela sociedade. Existe uma relação muito profunda entre a discriminação de género e a discriminação com base na orientação sexual. As formas mais relevantes do sexismo são o machismo, a misoginia, a homofobia, a lesbofobia, a bifobia e a transfobia. E uma característica comum a todas elas é que são a expressão de formas centradas no domínio masculino e patriarcal.

Sexismo, homofobia e transfobia, estão intimamente ligados quando se considera a heterossexualidade como natural, superior e positiva, e a homossexualidade, como inferior, negativa, e anti-natural. As atitudes de hostilidade e violência contra gays, lésbicas, bissexuais e transgéneros são manifestações desta forma de sexismo que, como as demais, legitíma, justifica e torna inquestionável a sua prática. Para desenvolver uma sociedade inclusiva e uma economia mais dinâmica, colhendo os frutos da diversidade, torna-se imperativo eliminar os factores de discriminação, enraizados nas nossas estruturas e práticas, em razão do sexo, do género, da orientação sexual e da identidade de género em todas as áreas nas quais o Estado tem responsabilidades.

A nós, enquanto sociedade/colectivo, falta-nos assegurar uma efectiva mudança social e cultural que ponha fim a modelos hegemónicos que oprimem, inviabilizam e silenciam tudo o que é tido como “fora da norma”. Falta-nos denunciar e combater sistematicamente qualquer forma de discriminação. Falta-nos construir outros imaginários. Falta-nos valorizar as diferentes identidades e formas de ser, estar e amar. Falta-nos mais liberdade, mais dignidade, mais igualdade.

A estes desafios, a estes imperativos, a coordenadora portuguesa da Marcha Mundial das Mulheres diz, como sempre disse, presente! E solidariza-se com todas as organizações, os movimentos, as pessoas que diariamente estão empenhadas em derrubar muros, em construir alicerces de uma cidadania plena para todos e todas, em construir um outro mundo que é possível.

Masculinidade(s)

«Linhas Imaginárias: Questões e Representações de Masculinidades em Equador» é o título da conferência que Daniel Matias dará na quinta-feira, dia 19 Maio, pelas 18h30, na FCSH/ UNL (torre B, auditório 2, piso 3), na avenida de Berna, 26 C.


Daniel Matias analisou a obra literária Equador da autoria de Miguel Sousa Tavares numa perspectiva de género. Atendendo à literatura existente sobre a matéria, procurou realizar-se uma reflexão sobre as masculinidades existentes na obra, nomeadamente como são construídas e apresentadas na sua relação, quais os lugares do feminino na obra, e como se constroem as relações de poder entre as personagens. Empregando a teoria crítica feminista, procurou analisar-se quais as ideologias presentes no texto em termos de género, através de uma apresentação das dicotomias existentes, revelando assim as contradições e paradoxos que presidem às construções de género. Tendo sido concluído que a obra tem por base um projecto democrático, sugerimos pistas em como esse projecto poderá alcançar maior expressão através de uma compreensão mais pertinente das relações de género e de como estas, na sua intersecção com outras dimensões sociais, constituem elementos fundamentais para uma participação fulcral do Outro no desenho de uma sociedade mais justa.

Daniel Matias é Mestre em Psicologia Comunitária (ISPA) e Mestre em Estudos sobre as Mulheres (FCHS-UNL). Na área interdisciplinar dos estudos de género, os seus interesses de investigação recaem sobre a área das masculinidades, pesquisa colaborativa e teoria crítica, actualmente abordando as relações entre os estudos de género e os estudos (pós)coloniais.

12.5.11

Vozes na República 1910-1926



Hoje e amanhã ouvem-se na Figueira da Foz «Outras Vozes...: trata-se do Congresso Nacional de História e Ciência Política. Para além do lançamento do livro «Mulheres na I República» ao final da tarde, na sexta-feira podem ser ouvidas no Palácio Sotto Mayor as vozes de Isabel Baltazar, Zília Osório de Castro, Natividade Monteiro, Maria Emília Stone (Faces de Eva/CESNOVA), entre muitas outras participações.



4.5.11

Debate sobre feminismos

Quinta há debate na Feira do Livro, numa mesa redonda com Manuela Tavares, João Esteves, Ana Vicente e Leonor Xavier sobre "Feminismos de ontem e de hoje".



5 MAIO
18h30
Debate «Feminismos de Ontem e de Hoje», com Manuela Tavares, autora do livro «Feminismos Percursos e desafios (1947-2007» (Texto, 2011), e com Leonor Xavier, Ana Vicente e João Esteves.
 
21h
Café concerto com actuação dos alunos da Escola de Jazz Luiz Villas-Boas na Praça LeYa, parceria LeYa/Out of the Blue/Hot Club de Portugal.
 

Mês de Carolina, a sufragista



2.5.11

sim, onde?



Paula, Maria e Louise







Uma exposição na cidade de Ljubljana, capital da Eslovénia, reúne as artistas Paula Roush, Maria Lusitano e a teórica Louise Michel, entre 4 e 25 de Maio, na P74 Gallery, Prušnikova 74. A inauguração é quarta-feira às 20h00, com a presença das artistas. O trabalho que será apresentado parte de um livro único, concebido por Paula e Maria Lusitano, girando à volta de uma biblioteca e arquivo pessoais de memória política e histórica, em Portugal, com especial incidência no período pós 25 de Abril de 1974. O projecto recebeu o nome de «Classop», uma contracção muito arty de «classe operária».